Há exatos 20 anos comecei a
trabalhar, na época tinha 15 de idade. Não foi um dia memorável, acabou ficando
registrado na memória como um verdadeiro inferno em minha vida. Ouvi os piores
desaforos, fui tratado mal e meu salário era o pior do lugar. E não trabalhava
menos que ninguém, fazia trabalho de adulto, tanto que três anos mais tarde ao
fazer o Serviço Militar foi uma porta de saída da qual sonhava há muito tempo.
Durante os três anos não foram somente lágrimas também tive momentos bons,
aprendi a conviver em sociedade, a ser mais flexível, a trabalhar e a partir
disso pude vivenciar momentos que antes não tinha tido oportunidade. Era um
caminho sem volta.
Antes de começar a trabalhar na
contabilidade Exata, propriedade do Senhor Antonio de Almeida Ferreira, minha
rotina era de casa a escola e da escola para casa e quando saia era com a
família, não conhecia o mundo fora desse eixo. E de repente no dia 01 de
fevereiro de 1994 tudo isso iria ruir desestabilizando tudo que conhecia.
Foi um período de grandes
incertezas em minha vida e como autodefesa eu fiquei mais arisco do que de
costume e isso ficou evidente logo de saída. Em contrapartida meu irmão que
sempre teve o gênio mais fácil acabou se tornando um dos queridinhos do dono.
Tanto que o registro em carteira dele aconteceu dois meses antes do meu, e o
meu registro somente ocorreu porque perguntei se iriam me registrar ou me
dispensar. Isso aconteceu no final do mês de julho daquele ano. E acabou
acontecendo no dia 1 de agosto, sete meses depois de começar a trabalhar.
Antes de continuar a contar esse
período que infelizmente me trás recordações não tão boas devo lembrar que esse
emprego eu não consegui por mérito próprio. Foi um acordo de família, o que
muitos chamam de ‘tartaruga de poste’, estava lá porque colocaram uma vez que
não iria conseguir um sozinho, devido minha timidez.
A esposa do Senhor Antonio, Ana
Maria Ferreira de Paula era uma cliente de minha mãe, que prestava serviços de
costureira e que indicou o nome do meu irmão e o meu para trabalhar no
escritório.
Antes mesmo de começarmos no escritório
ouve um ardil para ver qual de nós dois era o melhor para trabalhar no escritório.
Fomos convidados para passar alguns dias no chalé que ele tinha próximo de
Paraná, nesses dias pediam tudo que é tipo de favores. Meu irmão e eu fazíamos tudo
de bom grado. Meu irmão se destacou, trabalhava mais e era espontâneo e eu o
contrário disso.
Quando retornamos para casa a Ana
Maria conversou com minha mãe perguntando qual ela preferia que trabalhasse no
escritório. Minha mãe preferia que fosse eu, não por favoritismo e sim por
conhecer minha dificuldade pelo excesso de timidez, sabia que dificilmente
conseguiria um emprego sozinho.
Houve empate, então ficaram com
os dois, um por favoritismo e o outro por pena. A partir daí minha vida foi um
inferno, o Senhor Antonio fez o que pode para que eu desistisse do emprego, não
poupou esforços, e eu por minha parte resisti bravamente, mais por medo do que
por bravura, pois sabia se perdesse o emprego meus pais iriam me matar e não
conseguiria outro com facilidade. Aguentei muitas humilhações, salário mais
baixo e insultos de todos os tipos. Nessa época ouvia o Senhor Antônio gritar a
todo pulmão que era um incompetente, burro ou sei lá o quê, a que estava
trabalhando lá, por favor, aos meus pais.
Certa vez fui proibido de
executar o meu trabalho, o arquivo. Ficava a maior parte do tempo de braços
cruzados e quando o Senhor Antônio não estava no escritório pedia para ajudar
os demais e vez ou outra era flagrado. Numa dessas ajudas pedi para ser
auxiliar da Roseli, que penalizada com minha situação resolveu me ensinar o
serviço de escriturário.
Depois desse período fiquei
trabalhando sob a responsabilidade da Roseli e minha vida começou a ter um rumo
e para minha alegria o serviço militar obrigatório bateu em minha porta e lá
fui eu voluntário. Quando fui convocado para prestar o serviço militar foi a
maior alegria e definitivamente estava livre do Senhor Antonio.
Hoje, vinte anos depois não tenho
saudades daquele lugar, infelizmente tenho mais péssimas recordações do que
boas. Sei da importância em minha vida desse primeiro, da experiência, do
amadurecimento e infelizmente recordo perfeitamente das humilhações que lá
passei.
Vinte anos depois ainda consigo me
lembrar do gosto amargo de algumas palavras...
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